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Onde estão meus óculos?

 

Teste de memória em idosos evidencia que o esquecimento característico na terceira idade nem sempre é sinal de doença

 

Por Daniel Nek/UnB Agência

 

Quem nunca ouviu um idoso se queixar de esquecimento ou de trocar o nome de alguém com quem convive? No dia-a-dia, eles reclamam que não sabem mais onde deixam objetos, esquecem os aniversários e, com freqüência, irritam os filhos porque não se lembram de um recado importante. De acordo com a dissertação de mestrado “A memória dos idosos em tarefas complexas”, realizada pela psicóloga Terezinha de Jesus Van Erven, do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), a situação não é tão grave. Os esquecimentos, apesar de mais freqüentes nesta fase do desenvolvimento da pessoa, não estão necessariamente relacionados a doenças que mereçam preocupação ou tratamento. O trabalho foi publicada na edição de janeiro/abril 2004 da revista Psicologia: Teoria e Pesquisa, um dos mais importantes veículos de divulgação científica da área.

 

 

Para a pesquisadora, lembretes podem ajudar a resolver esquecimentos rotineiros

 

“Muitas vezes, o idoso vai ao médico, reclama da memória e é medicado por um problema que, na verdade, não representa uma patologia”, explica ela. O que o incomoda mais é a discriminação que sofre por causa dos esquecimentos, que, de acordo com a pesquisadora, podem ser uma conseqüência de situações de estresse, alimentação, enfim, causas de origem externa. Esse foi o principal motivo apontado por ela para a escolha do tema do estudo. “A própria expectativa do envelhecimento pode influir nesses processos”, acrescenta.

 

Durante os dois anos em que pesquisou o assunto, Terezinha realizou dois experimentos com dois grupos de cem jovens de 18 a 29 anos e cem idosos entre 58 e 87 anos, nos quais foram testadas a capacidade de memorização de palavras em sentenças simples e complexas. Nos dois procedimentos, feitos com marcação de tempo diferentes, foram testados ainda o julgamento de veracidade das sentenças e o uso de pistas para auxiliar a lembrança.

 

Todos os idosos passaram por seleção prévia para que fossem descartadas patologias relacionada à memória que comprometesse o resultado do teste. Outra característica considerada foi o tipo de atividade desenvolvida por eles – a grande maioria pertence a grupos, como o Coro dos Cinqüentões da UnB, cursos de línguas, xadrez, ginástica, etc. O perfil dos escolhidos excluiu idosos submetidos a situações de comprometimento emocional, depressão ou estresse, como o que normalmente ocorre com quem vive em asilos e instituições de repouso.

 

Sentenças complexas – Para traçar as características dos entrevistados, a psicóloga usou um grupo de doze sentenças simples, com sujeito e predicado, e 16 complexas, em que idosos e jovens deveriam, além de memorizar a última palavra, transformar orações negativas em positivas. Nas duas situações, o teste foi feito com marcações de tempo diferentes. Os jovens fizeram os testes no Instituto de Psicologia e, no caso dos idosos, a pesquisa foi em seu ambiente domiciliar. O computador precisou ser levado pela pesquisadora à casa de cada um deles, que por vezes não tinham facilidade de locomoção.

 

Entre os principais resultados dos testes, comparando-se os dois grupos, os idosos tiveram desempenho bastante semelhantes ao dos jovens quando o tempo para julgamento de veracidade das sentenças foi livre. O nível de acerto entre a turma mais nova foi de 93,5% enquanto para o pessoal da terceira idade foi de 89,5%, enquanto que, nesta condição seu rendimento caiu em 11%. Quando houve definição de tempo (oito segundos para cada sentença) os idosos tiveram em média 67,7% desempenho e os jovens 91%.

 

Para a professora, a explicação pode ser dada em função do cuidado que os idosos têm em realizar tarefas bem feitas e por isso concentram mais atenção em apenas uma delas. “È mais ou menos o que acontece quando o idoso está ao telefone e outra pessoa fala com ele. Ocorre uma seleção de informações”, explica. “O mesmo pode acontecer quando ele vai ao supermercado com uma lista de compras e apesar disso deixar de levar alguma coisa – isso porque ele acaba se envolvendo em outras atividades que requerem atenção, como escolha de marcas e seleção de preços”.

 

A solução para esses pequenos inconvenientes, segundo Terezinha, pode ser treinar a memória, escrever os recados em caderninhos e prestar mais atenção na rotina diária, como, por exemplo, estabelecer locais fixos para guardar os óculos ou pendurar as chaves de casa.

 

Com alguns anos de experiência em pesquisas com idosos, a psicóloga está em plena fase de estudos para o doutorado, também na linha de cognição e neurociências do comportamento. O objeto da pesquisa é descobrir como os idosos organizam o pensamento. Se os jovens associam a palavra prego a alfinete, por exemplo, a turma da terceira idade pode fazer outro tipo de associação, não relacionada à similaridade perceptual como a forma dos objetos, mas considerando uma relação funcional. Assim, prego estaria muito mais relacionado a martelo do que a alfinete que estaria funcionalmente ligado a agulha.

 

Terezinha de Jesus Van Erven é psicóloga da Fundação Educacional do Distrito Federal. E-mail: vanerven@unb.br

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Fonte: http://www.unb.br/acs/bcopauta/terceiraidade5.htm