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Idosos invisíveis

 

 

Por Maria Alice Nelli Machado – pesquisadora mentora

diretamente de Milão

 

Por que uma pessoa anciã se torna invisível e ignorada tanto viva quanto morta?

 

Esta é uma interrogação presente na matéria do jornal italiano “La Repubblica”, do dia 8 de janeiro de 2005, que trata da morte solitária de 4 idosos na cidade de Milão, no período compreendido entre Natal e Ano Novo. Relata o caso desses idosos que viviam completamente sós, isolados da família, dos vizinhos e da comunidade e que foram encontrados mortos depois de duas ou três semanas.

 

Em uma entrevista ao jornal, a socióloga Francesca Zajczyk, docente de sociologia da Universidade de Biccoca, que se dedica ao estudo da pobreza e da marginalidade, diz que o aumento demográfico dos idosos, que em grande parte vivem sós, está se tornando um problema objetivo que deve ser tratado.

 

Diz a pesquisadora que a cidade de Milão, a nível nacional, oferece boas condições de assistência aos anciãos, mas que isso não basta, pois os idosos são mais numerosos que a capacidade de atendimento instalada e muitos estão próximos dos serviços, mas em certo sentido invisíveis.

 

Os que estão na rede de assistência social recebem uma oferta discreta de ajuda e não prática, como no caso dos serviços de alimentação em domicílio; a entrega dos alimentos representa além da oferta dos gêneros alimentícios, uma possibilidade de contato diário e de controle das condições de vida de cada idoso assistido. Este tipo de assistência cria uma margem de sobrevivência física que não é garantida a outros.

 

Afirma ainda: ‘’Temo que o município não tenha um quadro real das condições dos anciãos de Milão, ou melhor, que conheça bem aquele que utiliza os serviços sociais. Mas os outros são como um mundo feito de buracos negros. Os sujeitos mais vulneráveis ao risco do isolamento, abandono e morte solitária são, sobretudo, os da classe social média-baixa e baixa, pois os com melhores condições financeiras possivelmente terão um parente que se encarregará deles. O problema dramático é este: que a solidão abre a porta para a tragédia como aquela desse dias, sobretudo onde mais pobreza’’.

 

A socióloga enfatiza ainda que esses problemas podem se agravar em período de festas, mas ele ocorre durante todo o ano e que talvez uma das soluções seja a criação de micro-projetos de vizinhança solidária, nos quais um vizinho estabeleceria uma relação cotidiana com o idoso, recebendo um pequeno aporte econômico do Estado. Seria uma forma de ampliar uma prática que existe, mas que vai aos poucos se perdendo.

 

Na edição de 9 de janeiro, o jornal ‘’La Repubblica’’ informa que são quase 300 mil pessoas acima de 65 anos vivendo em Milão, e desses,112 mil vivem sós. A maioria dos que vivem só apresenta problemas de solidão, mesmo que alguns deles tenham alguém que uma vez por semana venha ajudá-los a fazer as despesas de casa. Muitos desses procuram o serviço ‘’Fio de Prata” que oferece informações telefônicas e indica serviços disponíveis e que registra 150 a 200 chamadas por semana. Pelo menos a quarta parte dos que fazem a chamada é por se sentirem muito sós.

 

Só na cidade de Milão, 4550 idosos vivem em instituições de longa permanência. O município gasta 90 milhões de euros para manter a rede dessas instituições. São entregues 53 mil refeições em domicílio por voluntários de uma instituição de assistência. Isto significa que um grande número de idosos recebe algum tipo de atendimento.

 

Fatos como esses mobilizam a opinião pública e pressionam o Estado para ações de atenção ao segmento, que redundam em programas concretos. Basta ver os dados de atendimento publicados pelo jornal.

 

O que pensar da realidade de São Paulo, considerando apenas o dado de atendimento aos idosos que recebem refeições em casa por apresentarem profunda dependência: 20 refeições ao dia no programa Refeições sobre Rodas que corre risco de ser desativado!?