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Ser humano, educação e envelhecimento 

Patrícia Branco - Pesquisadora Mentora
patricia.branco@uol.com.br

O mundo vive um tempo de profundas crises sociais. Grandes e cegas potências atacam-se na inconsciência, derrotam-se pela escuridão da cegueira de seus olhos, prejudicam-se e matam impiedosamente o povo que pede por paz. Ao contrário do que se pede e do que realmente precisamos, o mundo está vivendo uma grande convulsão e um terrível momento de perda da identidade e civilidade de seus homens. A marginalização do homem, causada pela exclusão social e abandono de grande parcela da população mundial, aliada à falta de acesso a cultura, saúde e educação, caracteriza a realidade de muitos países, incluindo o Brasil, trazendo como consequência inevitável, o sofrimento do ser humano.

Ser humano não é simples. Sabemos que os vários problemas sociais aos quais o homem está submetido, independentemente de sua raça, condição econômica, cultural, social ou de gênero, vêm produzindo, sobretudo com a globalização, vítimas de um sistema incapaz de acolher o homem em suas especificidades e necessidades. Aliado a esta grave questão, outros aspectos da condição humana, assim como a depressão, a falta de esperança e segurança social surgem como grandes referenciais da vida do homem em sociedade, tornando-os, não apenas vítimas de um sistema, mas vítimas de si mesmo, num mundo em mutação permanente e complexidade crescente.

Com a modernidade e contemporaneidade, o ser humano entrou num processo inconsciente de crise existencial, porque foi levado a acreditar em valores sociais definidos por culturas globais e jamais incorporados em outros momentos de sua história de vida. Além disso, passou a adotar estilos de vida e práticas sociais não características de seu grupo social, fazendo-o se afastar de sua cultura e identidade local. As noções humanas sobre espaço e tempo local foram transformadas em noções de espaço e tempo global. “O mundo se torna mais complexo e mais simples, micro e macro, épico e dramático”, assim como afirma Octavio Ianni em seu textoGlobalização: novos paradigmas das Ciências Sociais”.

E na complexidade e simplicidade do mundo, considerando seu aspecto épico e dramático, o homem teve que encontrar meios para viver a sincronia na diacronia, percebendo-se como parte de um macro, sem desconsiderar o micro, sentindo-se singular na universalidade e diversidade do mundo. Refletindo sobre o que é ser humano, veremos que a condição básica da existência humana consciente revela-se quando ele se percebe como alguém situado numa realidade complexa, onde todos as variáveis se interligam, se complementam e que, por isso, devem ser percebidas e analisadas simultaneamente.

No entanto, se considerarmos a realidade de vida brasileira, com exceção de algumas regiões desenvolvidas e não menos carentes, perceberemos que a utopia possível e necessária de tornar o homem capaz de interpretar consciente e criticamente sua natureza humana e social, está longe de ser alcançada parcialmente. Para que essa utopia possa ser um dia realidade de fato, o ser humano, em qualquer etapa da vida, precisa descobrir a necessidade e a importância de viver a educação em seu sentido formal e informal, continuamente. Além das habilidades iniciais adquiridas nos primeiros anos de escolaridade, o ser humano precisa adquirir outras tantas para viver a complexidade dos relacionamentos humanos e da própria vida em sociedade, que a socialização também é valiosa fonte de educação humana.

Nessa perspectiva, acredito ser urgente e fundamental a revisão e/ou reconstrução dos valores éticos propostos pelas escolas de educação infantil, ensino fundamental, médio, profissionalizante e superior, assim como o fortalecimento de suas práticas pedagógicas, no intuito de garantirem eficazmente a formação de indivíduos críticos, éticos e solidários, capazes de exercerem a sua cidadania plenamente, fazendo-os também refletir sobre a sua existência no mundo e sobre o que podem fazer por ele.

O ser humano precisa acompanhar a transformação do mundo e, esta, deve ser conseqüência de uma ação humana consciente e responsável. Sabe-se que através da educação formal, informal e ao longo da vida, torna-se possível acreditar na possibilidade de intervir no mundo, assim como afirma Paulo Freire, em seu texto “Do direito e do dever de mudar o mundo”. Em suas palavras, “a tarefa progressista é assim estimular e possibilitar, nas circunstâncias mais diferentes, a capacidade de intervenção no mundo, jamais o seu contrário, o cruzamento de braços em face aos desafios”.

Considerando o direito e o dever de intervir no mundo, dentre outros desafios da contemporaneidade, devemos conceber esta tarefa como um projeto de vida para todas as pessoas e fases do desenvolvimento humano. E se, até certo tempo, esta tarefa era considerada apenas desafio para os jovens “entusiasmados e cheios de vida”, hoje, experiências vigorosas e bem sucedidas com o grupo populacional envelhecido, estão construindo uma outra paisagem para este cenário preconceituoso, tornando a idéia de que os idosos sãovelhos demaispara alterar alguma coisa no mundo, quase irrelevante.

As universidades abertas para a terceira idade, os grupos de convivência para idosos, os projetos intergeracionais desenvolvidos por escolas do ensino fundamental e médio, as organizações não governamentais que desenvolvem projetos com a terceira idade, os centros de pesquisa e as instituições de ensino superior interessadas em propor estudos e reflexões sobre o envelhecimento, são exemplos vivos de instituições que concebem a velhice como um tempo de possibilidades, construções significativas e desafios permanentes.

Considerando os desafios permanentes característicos da vida humana, devemos lembrar que toda sociedade, em maior ou menor grau, é constituída por pessoas idosas. Neste sentido, toda instituição educacional, inclusive a família, deve ensinar aos jovens, dentre outros valores importantes, que o idoso, como todo ser humano, tem direitos e deveres e por isso se configura como cidadão. Aprender cidadania desde cedo e ser cidadão na velhice são desafios possíveis que devem ser valorizados por todas as instituições que se definem educativas e promotoras da cidadania. A longevidade, com qualidade de vida, será naturalmente o resultado da incorporação da idéia de que o idoso pode e deve ser considerado cidadão, construindo sua história com dignidade, autonomia, esperança e felicidade.

E neste processo de construção com autonomia, devemos lembrar que os idosos não podem estar sozinhos. Devem buscar formas diferentes de interação com outros e ter o privilégio de ensinar gerações mais novas, aprendendo com elas, maneiras criativas de se viver o envelhecimento. Viver o envelhecimento criativamente supõe estar conectado ao mundo e atento às suas transformações.

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