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Obscurantismo, editorial de
'O Globo'
No que se refere às células-tronco, o projeto da Lei de
Biossegurança é um verdadeiro modelo de obscurantismo
A recente
inauguração, na Inglaterra, do primeiro banco de células-tronco
embrionárias, destinadas à pesquisa, é um importante passo à frente
na busca de tratamento para doenças que hoje são incuráveis.
Essa área de investigação científica é hoje a maior, senão a única,
esperança das vítimas de mal de Parkinson, Alzheimer, diabetes e
toda sorte de moléstias degenerativas.
É portanto motivo de entusiasmo para os defensores do progresso
científico e tecnológico, e vem se somar a outras boas notícias,
como a aberta defesa dos alimentos transgênicos pela Organização
para Agricultura e Alimentação (FAO), da ONU, como instrumento para
o combate à fome mundial.
Na mesma linha, a União Européia liberou a importação e
comercialização durante dez anos do milho geneticamente modificado
da Syngenta, resistente a insetos. Numa demonstração de elementar
sensatez, a Comissão Européia considerou que as regras de rotulagem
em vigor são mais do que suficientes para assegurar proteção aos
consumidores que receiem maus efeitos dos transgênicos.
O Brasil não está muito atrás no que se refere aos transgênicos.
Ainda que o projeto da Lei de Biossegurança aprovado na Câmara dos
Deputados apresente falhas também nesse aspecto, tem pelo menos o
mérito de preservar a autonomia da Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança (CTNBio) no que se refere a autorizar pesquisa e
plantio, com a finalidade de estudos, de sementes geneticamente
modificadas.
Mas no que se refere às células-tronco, o projeto é um verdadeiro
modelo de obscurantismo. Por pressão de bancadas religiosas, seu
texto foi modificado de maneira a incluir a proibição do uso de
células de embriões humanos em experiências - uma barreira
intransponível às pesquisas.
A palavra agora está com o Senado. Os cientistas brasileiros que
lutam por uma mudança no texto não têm o poder de pressão dos
lobbies evangélicos e outros, mas contam com o poder de
convencimento das boas causas.
Eles precisam ser ouvidos pelos senadores, porque o preço de uma
vitória do obscurantismo será pago por todo o país, na moeda do
atraso na ciência.
Fonte: O Globo - 27/05/2004
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