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Mães da Praça de Maio celebram fim da anistia ,
As leis de anistia foram aprovadas no governo de Raúl Alfonsín As vítimas da recente ditadura argentina receberam com lágrimas, aplausos e abraços de parentes a notícia da decisão da Suprema Corte, que considerou inconstitucionais as leis de anistia. As leis revogadas, conhecidas como leis de "obediência devida" e "ponto final", impediam processos contra militares por envolvimento na repressão durante a ditadura entre 1976 e 1983. Com as tradicionais fraldas na cabeça, que as caracterizaram durante mais de 20 anos, as mães e avós da Praça de Maio, todas com mais de 70 anos, diziam que a luta tinha valido a pena. Ainda não se sabe ao certo quantos militares poderiam ir a julgamento a partir dessa decisão. Especula-se, entre as entidades de direitos humanos, que poderiam ser entre 500 e mil. Emoção As mães e avós dos desaparecidos políticos mal puderam conter a emoção em frente ao tribunal onde está a Suprema Corte de Justiça. “Nós pensávamos que não estaríamos vivas para ver essa notícia”, disse uma delas, aos prantos, diante das câmeras de TV. “Aqui, não ocorreu uma guerra, mas um terrorismo de Estado, com 600 campos de concentração e 30 mil desaparecidos”, acrescentou Estela Carlotto, presidente das Avós da Praça de Maio. Estela perdeu a filha Laura na ditadura, mas ainda procura o neto, Guido, "roubado", como afirma, pelos militares e entregue a alguma outra família. Até agora, essa entidade já localizou 80 netos – filhos dos desaparecidos políticos que acabaram criados, muitas vezes, pelos algozes de seus pais. “A nossa expectativa, agora, é que os casos (de desaparecimento) sejam abertos um por um”, disse. Estela reuniu documentos que indicam qual seria o provável assassino de sua filha, mas só esperava a decisão da Suprema Corte para voltar a insistir que ele vá para a prisão. Para Nora Cortiñas, da entidade Mães da Praça de Maio, Linha Fundadora, os militares cometeram crimes de lesa humanidade, que não podem ficar impunes.
“Essa é uma decisão inédita no mundo e poderá abrir precedente para outros países. Mas ainda não sabemos quantos, exatamente, poderiam ir ou não para o banco dos réus”, disse à BBC Brasil o advogado Ricardo Gil Laavedra, ministro da Justiça do governo de Raúl Alfonsín. O ex-presidente assinou aquelas leis do perdão, nos anos 80, quando as rebeliões militares, costuma recordar, ameaçavam o país. “Na prática, comparativamente, seria o mesmo que os governos da América do Sul anulassem as anistias aplicadas em seus países. E que o mesmo ocorresse na Espanha, onde foram anistiados os crimes do (general Francisco) Franco”, disse Gil Laavedra. O jurista Julio Strassera, ex-promotor daquele julgamento dos militares nos anos 80, disse, por sua vez, que muitas provas “podem ter sido destruídas”. Ele lembrou que centenas de processos ficaram paralisados e que agora vai ser preciso ver caso a caso. Quartelada A partir desse momento, informou Laavedra, os juízes de diferentes tribunais vão começar a reabrir causas que tinham sido fechadas quando Alfonsín assinou as leis que beneficiaram militares de segundo escalão para baixo. Anos mais tarde, o ex-presidente justificou, reiteradamente, que seu governo estava por um fio, sob ameaça das “quarteladas”, quando se viu obrigado a adotar as leis do perdão. Gil Laavedra explicou que a decisão, tomada nesta terça-feira por sete dos nove ministros da Suprema Corte de Justiça, afeta ainda o indulto concedido pelo ex-presidente Carlos Menem, que perdoou as cúpulas militares, como o ex-ditador Jorge Rafael Videla. “Mas a diferença é que muitos deles já foram julgados e dificilmente, por essa decisão de agora, poderão voltar ao banco dos réus”, esclareceu. Nesse caso, o julgamento foi possível porque eles foram acusados do seqüestro e roubo de bebês, filhos de desaparecidas políticas, que estavam grávidas, naqueles anos de chumbo. O crime não estava previsto nas leis do perdão e por isso eles puderam ser julgados. O ministro da Defesa, José Pampuro, disse que não há perigo de nenhum tipo de rebelião, após a decisão da Suprema Corte. Por sua vez, o presidente Néstor Kirchner declarou que a decisão da Suprema Corte “devolve a fé dos argentinos na Justiça”. _______________________________
Fonte: BBCBrasil.com |