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O idoso aprendiz Como saber envelhecer nesta sociedade tão complexa do início do século XXI? São tantos valores modificados, distorcidos, que impedem o homem de se humanizar. A família não escapa destas transformações e sua nova configuração desencadeia também novas formas de encararmos a velhice. Quem cuidará do velho? Há muitas e diferentes velhices, todas com necessidades afetivas, sociais, econômicas a serem atendidas.E por quem? Pelo Estado? Pela família? Pela sociedade? Pela filantropia? Ou pelo próprio velho? Instalou-se a velhice como problema social. E o medo de envelhecer. -“Eu acolho o envelhecimento. É muito simples. À medida que se cresce, aprende-se mais. Se ficássemos parados nos vinte e dois anos, ficaríamos sempre ignorantes como quando tínhamos vinte e dois anos. Envelhecer não é decair fisicamente. É crescer. É mais do que o fato negativo de que se vai morrer, é também o fato positivo de que se compreende que se vai morrer e que se pode viver melhor por causa disso. - É, mas se envelhecer fosse tão valioso, por que as pessoas vivem dizendo, “ah, se eu ainda fosse jovem...?”. Nunca ouvimos ninguém dizer, “quem me dera já ter sessenta e cinco!”. - Sabe o que isto significa? Vidas insatisfeitas. Vidas sem realizações. Vidas que não encontram um sentido. Quem encontra um sentido para a vida não deseja voltar atrás. Deseja ir em frente. Quer ver mais, fazer mais. Não se pode ficar esperando chegar aos sessenta e cinco. Ouça. Você precisa saber uma coisa. Todas as pessoas mais jovens precisam saber disso. Quem passa o tempo batalhando contra o envelhecimento sempre será infeliz, porque o envelhecimento é inexorável. É impossível a um velho não invejar um jovem. Mas a questão é aceitar o que somos e gostar. Precisamos descobrir o que existe de bom e verdadeiro e belo em cada fase de nossa vida. A verdade é que cada parte minha tem todas as idades. Sou uma criança de três anos, uma de cinco, um homem de trinta e sete , um de cinqüenta. Passei por todas essas idades e sei como é cada uma. Delicio-me com ser criança quando é apropriado ser criança. Delicio-me em ser um velho que sabe as coisas quando é apropriado ser um velho sábio. Imagine tudo o que posso ser! Sou todas as idades, da atual para baixo. Percebeu?” (Albom, Mitch)[1] Se, atualmente, a velhice é vista como um problema social, é preciso procurar novas vias para se ter acesso aonde se quer chegar e estar. E a educação se apresenta como essa nova via. Ter o idoso como aprendente, na educação formal ou informal, quebrando paradigmas e construindo sua própria identidade. “É muito mais difícil desaprender o aprendido do que aprender uma coisa nova. O aprendido se agarra na gente de uma forma terrível e é o aprendido que impede que eu aprenda uma coisa de maneira diferente. Então, é preciso desaprender o aprendido ... É preciso ter olho novo para ver as coisas velhas de maneira diferente”. (Alves, Rubens)[2] Acreditando nesta possibilidade de o idoso ser aprendiz, abrem-se inúmeras oportunidades de aprendizagens para ele, desde cursos de graduação, conforme seus interesses, a cursos livres: universidades abertas à terceira idade, de informática, de idiomas, etc..., inclusive oficinas chamadas de workshops[3], onde “aprendem” a “educar” suas emoções, desenvolver sua inteligência emocional, elevar sua auto-estima, como um pressuposto para buscar esta nova velhice e acreditar nela, onde não há caminhos prontos.Os antigos não satisfazem suas novas e reais necessidades. A educação vem ajudar o idoso a construir a sua velhice, de maneira digna, inserido na família, na sociedade, estirpando estigmas que o aprisionam. Através dela, o idoso tem chance de mudar o rumo de sua vida, redimensioná-la e redirecionar suas ações para ter liberdade de escolhas, (que na maioria das vezes lhe são negadas, ou por imposição ou por superproteção) emergir com novos pensamentos, novas maneiras de ser e estar no mundo. Realizar uma verdadeira reforma no seu pensamento! Aprender a pensar, a fazer uma nova leitura de sua realidade, a ser consciente, a ser sujeito. Será que estes cursos de Alfabetização de Adultos, por exemplo, são efetivamente cursos de alfabetismo funcional? Há realmente preocupação em desenvolver a capacidade de leitura e da escrita para fins pragmáticos, em contextos do dia a dia, doméstico ou de trabalho, para que estas pessoas se tornem mais conscientes e com melhor desempenho para modificar e interferir na sua realidade? No Brasil, sabe-se que trabalhos na área de alfabetização funcional não são muito comuns. Em um mundo onde os padrões tradicionais de trabalho e de carreira estão desaparecendo e a procura por trabalhadores com mais idade, como também com menos habilidades está acabando, a mudança freqüente do trabalho, o aprendizado pela vida toda e a alfabetização são as chaves para o futuro. Vejamos a Manchete do jornal O Estado de S.Paulo, no dia 18/04/05, caderno L1: “O projeto de PC popular, continua no reino da realidade virtual” - O PC Conectado para promover a inclusão digital, continua no reino da realidade virtual. - Tecnologia é um instrumento indispensável para que o Brasil deixe de ser o eterno país do futuro. - O governo prometeu acesso público a computadores para a população carente, em milhares de infocentros com a marca Casa Brasil. - Outro problema na estratégia do governo é não integrar a política de tecnologia com a política educacional. Especialistas afirmam que não basta facilitar o acesso da população de baixa renda aos computadores. Analfabetos funcionais só poderão usar os PCs para jogar videogames ou baixar pornografia da internet. Você pode pensar : o que tem a ver este projeto com a educação dos idosos? Tudo. Porque, quando falamos em educação, principalmente para os idosos, estamos apontando para uma educação transformadora, reflexiva, que dê chances para o idoso reorganizar-se, escolher e criar novos caminhos. O domínio da comunicação virtual hoje é muito importante para o idoso ser incluído virtualmente. Quem vai se lembrar dele nesta nova tecnologia? Ele mesmo!!! É necessário estimulá-lo para que ouse, perca seu medo em aprender, que só aprende quem erra também. Do fogão de lenha ao forno de microondas e à internet, há um longo percurso. Mas nada o impede de percorrê-lo. As pessoas aprendem até o final da vida, se seu cérebro for utilizado com estímulos mentais contínuos.Têm que querer sair da sua zona de conforto – lar, tv, crochês, netos – que são atividades rotineiras, e buscar novidades, novas aprendizagens, mais compatíveis com a sociedade moderna. A educação é, portanto, um imperativo para desencadear essa transformação. Um trabalho multi e interdisciplinar, com profissionais envolvidos na saúde, nutrição, aspecto psicológico, corporal, cognitivo, emocional; uma educação para a terceira idade que crie um espaço para discussões, trabalho em conjunto, para garantir o desenvolvimento do homem como um todo, e não somente o aspecto intelectual ou de lazer. Essa educação funcionará também como um programa terapêutico sobre memória, concentração, capacidade cognitiva, aprendizado e criatividade. Portanto, os programas de educação para idosos devem possibilitar a discussão corajosa de sua problemática e de inserção nesta problemática, para provocar uma ressignificação nas suas vidas. Na atual conjuntura, esta educação não deverá começar na terceira idade. Quanto antes se processar, mais rápido se fará a conscientização das pessoas, e medidas serão tomadas para prevenir, modificar a velhice. Esta conscientização das pessoas, inclusive de profissionais e políticos que podem alterar e auxiliar nesta nova concepção do envelhecimento, ainda não se fez. O descaso com este segmento etário é muito grande, tanto na saúde pública, como no aspecto financeiro, vide o valor da aposentadoria, a dependência dos idosos muitas vezes para sua locomoção, para compreenderem e atuarem com novas tecnologias, como o cartão bancário, internet. É fundamental e imprescindível estimularmos os idosos a voltarem a “estudar”, a ter interesse em sua autonomia, para que eles próprios resolvam seus problemas, desde os rotineiros até os mais complexos, e sejam capazes de participar e influir nas decisões que lhes dizem respeito. “Não é preciso consenso nem arte, nem beleza ou idade: a vida é sempre dentro e agora. (a vida é minha para ser ousada)
A vida pode florescer Numa existência inteira. Mas tem de ser buscada, tem de ser conquistada.” (Lya Luft) Eu acredito, como estudiosa da Gerontologia Educacional, que será pela educação que o idoso conscientizado e envolvido terá condições de fazer ouvir sua voz, mudar e implantar o novo paradigma de velhice. Venho atuando na educação com idosos há 8 anos, e estes trabalhos estão registrados nas publicações abaixo.A minha intenção é oferecer leituras na área da gerontologia educacional e que elas sejam estimuladoras para você conhecer e participar desse novo paradigma de velhice.
[1]
Mitch, Albom. O sentido da vida. A última grande lição –
Rio de Janeiro: GMT, 1998, p.117.
Mariúza Pelloso LimaMestre em Gerontologia, Pós-graduada em Psicologia da Educação, Pedagoga, Psicomotricista, Psicodramatista, Terapeuta Antroposófica – Quirofonética, Coordenadora do Om Sai Ram Centro de Estudos da Memória, Professora no COGEAE-PUCSP – curso de extensão Educação e Envelhecimento, Professora na Faculdade de Medicina-USP – Curso de Especialização em Gerontologia. É autora de Gerontologia Educacional. Uma Pedagogia Específica para o Idoso. Uma nova concepção de velhice (LTr, 2000); Reformas paradigmáticas na velhice do século XXI. In: Longevidade – um novo desafio para a educação. Vitória Kachar (org.) (Cortez, 2001); Gerontologia Educacional. In: Revista Kairós – Gerontologia – PUCSP (v4-n.1, Educ, 2001.
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